Sunday, November 7, 2010

O Problema do Ser

O Problema do Ser(Introdução) Léon Denis



Nos meios universitários, uma completa incerteza ainda reina sobre a solução do problema mais importante com que o homem se defronta no decorrer de sua passagem pela Terra. Essa incerteza se reflete em todo o ensino. Uma boa parte dos professores e pedagogos afasta sistematicamente de suas lições tudo o que se refere ao problema da vida, às questões de seu objetivo e finalidade.
Encontramos a mesma dificuldade nos líderes religiosos. Por suas afirmações desprovidas de provas, conseguem comunicar às almas sobre as quais têm responsabilidade apenas uma crença que não responde mais à lógica de uma crítica sã nem às exigências da razão.
A rigor, na universidade, assim como na Igreja, modernamente a alma encontra somente obscuridade e contradição em tudo que diz respeito ao problema de sua natureza e de seu futuro. É a esse estado de coisas que é preciso atribuir, em grande parte, os males de nosso tempo: a incoerência das idéias, a desordem da consciência, a anarquia moral e social.
A educação dispensada às gerações é complicada: não lhes esclarece o caminho da vida e não as estimula para as lutas da existência. O ensino clássico habilita a cultivar, a ornar a inteligência, mas não ensina a agir, a amar, a se dedicar nem a alcançar uma concepção do destino que desenvolva as energias profundas do eu e oriente nossos impulsos, nossos esforços, para um objetivo elevado. No entanto, essa concepção é indispensável a todo ser, a toda sociedade, porque é o sustentáculo, a consolação suprema nas horas difíceis, a fonte das virtudes atuantes e das altas inspirações.

[… texto suprimido do original.]

Daí o desânimo precoce e o pessimismo desanimador, doenças das sociedades decadentes, ameaças terríveis para o futuro, às quais se acrescenta o ceticismo amargo e zombeteiro de tantos jovens que acreditam apenas no dinheiro e honram apenas o sucesso.

[…texto suprimido do original.]

É tempo de reagir com vigor contra essas doutrinas funestas e de procurar, fora da órbita oficial e das velhas crenças, novos métodos de ensino que respondam às imperiosas necessidades do momento presente. É preciso preparar os espíritos para as necessidades, os combates da vida atual e das vidas futuras; é preciso, sobretudo, ensinar o ser humano a se conhecer, a desenvolver, em vista de seus objetivos, as forças latentes que nele dormem.
Até aqui, o pensamento esteve limitado a círculos estreitos: religiões, escolas ou sistemas que se digladiam e se combatem reciprocamente. Daí essa divisão profunda das idéias, essas correntes violentas e contrárias que perturbam e transtornam o meio social.
Aprendamos a sair desses círculos rígidos e a dar livre expansão ao pensamento. Cada sistema contém uma parte de verdade; nenhum contém a realidade por completo. O universo e a vida possuem aspectos bastante variados, bastante numerosos para que algum sistema possa abarcar todos.

[…texto suprimido do original.]

A crise moral e a decadência de nossa época provêm, em grande parte, do fato de o espírito humano ter se imobilizado durante muito tempo. É preciso tirá-lo da inércia, das rotinas seculares, levá-lo às mais elevadas altitudes, sem perder de vista as bases sólidas que vêm oferecer-lhe uma ciência engrandecida e renovada.

[…texto suprimido do original.]

A perturbação e a incerteza que verificamos no ensino repercutem e se encontram, como dissemos, em toda ordem social. Por toda parte, há um estado de crise inquietante. Sob a superfície brilhante de uma civilização refinada, esconde-se um mal-estar profundo. A irritação cresce nas classes sociais. O conflito de interesses, a luta pela vida tornam-se, dia a dia, mais ásperos. O sentimento do dever tem-se enfraquecido na consciência popular a tal ponto que muitos homens nem mesmo sabem onde está o dever.

[…texto suprimido do original.]

Onde está, então, a explicação desse mistério, dessa contradição notável entre as aspirações generosas de nosso tempo e a realidade brutal dos fatos? Por que um regime que havia despertado tantas esperanças ameaça chegar à anarquia, à ruptura de todo o equilíbrio social?
A implacável lógica vai nos responder: a democracia, radical ou socialista, nas massas profundas e em seu espírito dirigente, inspirando-se nas doutrinas negativistas, podia chegar somente a um resultado negativo para a felicidade e a elevação da humanidade.
Tal o ideal, tal o homem; tal a nação, tal o país!

[…texto suprimido do original.]

A educação, sabemos, é o fator mais poderoso do progresso; ela contém a origem do futuro. Mas, para ser completa, deve se inspirar no estudo da vida sob suas duas formas alternantes, visível e invisível, em sua plenitude, em sua evolução crescente em direção aos cimos da natureza e do pensamento.
Os mestres dirigentes da humanidade têm um dever imediato a cumprir. É o de recolocar o espiritualismo na base da educação, de trabalhar para refazer o homem interior e a saúde moral.
É preciso despertar a alma humana, adormecida por uma teoria destrutiva, mostrar-lhe seus poderes ocultos, fazê-la ter consciência de si mesma, para realizar seu glorioso destino.

[… texto suprimido do original.]

A ciência moderna analisou o mundo exterior; suas descobertas no universo objetivo são profundas: isso será sua honra e sua glória; mas ainda não sabe nada sobre o universo invisível e o mundo interior. É esse o império ilimitado que lhe resta conquistar. Saber por quais laços o homem se liga ao conjunto, descer às sinuosidades misteriosas do ser, onde a sombra e a luz se misturam como na caverna de Platão*, percorrer seus labirintos, os redutos secretos, procurar conhecer o “eu” moral e o “eu” profundo, a consciência e a subconsciência: não há estudo mais necessário que esse. Enquanto as escolas e as academias não o tiverem introduzido em seus programas, nada terão feito pela educação definitiva da humanidade.

[… texto suprimido do original.]

Um tempo se acaba; novos tempos se anunciam. A hora em que estamos é de crise, de parto doloroso. As formas esgotadas do passado empalidecem e se desfazem para dar lugar a outras, de início vagas e confusas, mas que se definem cada vez mais. Nelas se esboça o pensamento crescente da humanidade.

[… texto suprimido do original.]

Entretanto, atualmente, pode-se viver e agir com mais intensidade do que nunca. Mas é possível viver e agir plenamente sem ter consciência do objetivo a ser atingido? O estado da alma contemporânea pede, reclama, uma ciência, uma arte, uma religião de luz e liberdade que venham dissipar-lhe as dúvidas, libertá-la das velhas servidões e das misérias do pensamento, guiá-la para os horizontes radiosos aonde se sente levada por sua própria natureza e pelo impulso de forças irresistíveis.

Muito se fala sobre progresso, mas o que se entende por progresso? É uma palavra vazia e sonora na boca dos oradores, para a maior parte dos materialistas, ou possui um sentido determinado?

[… texto suprimido do original.]

O progresso não consiste somente nas obras materiais, na criação de máquinas poderosas e de todo equipamento industrial; não consiste, igualmente, em descobrir processos novos de arte, de literatura ou de formas de eloqüência. Seu objetivo mais alto é agarrar, atingir a idéia primordial, a idéia-mãe que fecundará toda a vida humana, a fonte elevada e pura de onde derivarão, ao mesmo tempo, as verdades, os princípios, os sentimentos que inspirarão as obras importantes e as nobres ações.

[…texto suprimido do original.]

Tudo nos diz isso: o universo é regido pela lei de evolução; é isso o que entendemos pela palavra progresso. E nós mesmos, em nosso princípio de vida, em nossa alma e nossa consciência, estamos sempre submetidos a essa lei. Não se pode desconhecer hoje essa força soberana que conduz a alma e suas obras através do infinito do tempo e do espaço, rumo a um objetivo sempre mais elevado; mas uma lei assim só pode concretizar-se por nossos esforços.

Para fazer obra útil, para cooperar com a evolução geral e recolher dela todos os frutos, é preciso antes aprender a distinguir, a reconhecer a razão, a causa e o objetivo dessa evolução, saber aonde ela conduz, a fim de participar, na plenitude das forças e das faculdades que dormem em nós, dessa ascensão grandiosa.

[…texto suprimido do original.]

Vamos rumo ao futuro, rumo à vida sempre renascente, pelo caminho imenso que nos abre o Espiritismo!
Tradições, ciências, filosofias, religiões, iluminai-vos com uma chama nova; sacudi vossos velhos sudários* e as cinzas que os cobrem. Escutai as vozes reveladoras do túmulo, elas nos trazem uma renovação do pensamento com os segredos do além, que o homem tem necessidade de conhecer para melhor viver, melhor agir e melhor morrer!


Léon Denis